A Estética Primordial: Arte para quê?

23/08/2011 - 17h22

Arte para quê? No decorrer dos séculos, diferentes concepções foram tecidas acerca de um dos assuntos mais polêmicos da humanidade, juntamente com a religião. Subjetividade, objetividade, conceito, antiestética, beleza... Arte para quê?
Nos primórdios da civilização, ou mesmo antes disso, a arte, desde o seu nascimento, era indissociavelmente atrelada à religiosidade, ao misticismo espiritual dos povos. Talvez seja esse o motivo de a arte e a religião serem igualmente polêmicas (apenas uma suposição sem fundamentos). O homem pré-histórico pintava nas paredes das cavernas (pintura rupestre) a figura de um animal, visando “aprisionar” seu espírito, para caçá-lo com mais facilidade no outro dia. No livro das Crônicas, no Antigo Testamento judaico-cristão, temos o relato do rei Davi, que tocava sua harpa para expulsar os maus espíritos que atormentavam seu sogro e antecessor, o rei Saul. Na idade média, os menestréis cantavam seus amores e seus protestos na forma de trovas, enquanto as artes plásticas enalteciam o Espírito Supremo de Deus com suas obras suntuosas, como as igrejas góticas e as pinturas nos tetos das catedrais. Arte sacra, arte profana. Arte cult ou arte mercadológica. Arte para quê?
Desde a Antigüidade Clássica, filósofos e críticos de arte, acompanhando a evolução da “ciência do belo”, criaram inúmeras teorias, tão discrepantes entre si, sobre o verdadeiro significado da obra de arte, do artista, da função social da arte, da filosofia da beleza. Da estética. Sócrates, Platão, Santo Agostinho, David Hume, Immanuel Kant, Jean-Paul Sartre, Friedrich Nietschzie, para citar apenas um fragmento desses pensadores da beleza, deixaram-nos tratados e mais tratados sobre o assunto.
Ideias que colocam a obra de arte no centro da fruição estética, outras que põem o observador como peça fundamental, dizendo que a beleza está no espírito do observador, sendo o objeto em si destituído de beleza própria, entre muitos outros conceitos herméticos para pobres mortais como nós. 
A verdade parece ser que tais conceitos, hodiernamente, soam um tanto quanto obsoletos na pós-modernidade, uma época em que, como já profetizara o sociólogo alemão Theodor W. Adorno, toda arte se resumiu a mercadorias como quaisquer outras, destituindo-se de sentidos e percepções mediatas. Nas palavras do esteta italiano Umberto Eco, o politeísmo artístico da contemporaneidade parece não aceitar muitas colocações sofismáticas, tal é seu dinamismo e sua necessidade publicitária. Vender o produto parece ser o mais importante.
O espírito avassalador da aldeia global, com seu anti-nacionalismo, parece ter diluído toda filosofia da beleza, todas as teorias estéticas anteriores à Segunda Grande Guerra, à Guerra Fria, ao pós-comunismo, à queda do muro de Berlim, ao pós-11 de setembro. O único sobrevivente de tudo isso, mesmo com o furor publicitário do capitalismo e da internet, parece ser a Estética. Mesmo que seja a estética do mercado, do consumismo, para que um produto se caracterize como obra de arte, a estética se transforma em único fator primordial, sendo impossível dissociá-lo da obra. Seja uma canção de amor ou não, uma canção de protesto político ou não, uma tela abstrata ou não, um filme de terror ou não, o que não pode ser retirado da arte é o fator estético. Seja ele qual for.
Em síntese, a arte sofreu como ninguém, na pós-modernidade, mudanças radicais no seu escopo ideológico, principalmente pelas características agressivas do mercado e da cultura de massas, deixando no passado todos os ideais incoerentes com o Terceiro Milênio. Mas o que ficou, e o que ficará enquanto a arte for arte, será a Estética. A Estética Primordial. E nada mais.