Malheiros defende mais reflexão sobre descriminalização das drogas

Em palestra na Câmara Municipal, desembargador diz que ideia pode ser interessante

12/07/2012 - 03h27

O desembargador do Tribunal de Justiça, Antonio Carlos Malheiros, defende uma reflexão mais aprofundada sobre a proposta de descriminalização das drogas no Brasil, mas considera que a ideia “pode ser interessante”. A afirmação foi feita em palestra na Câmara Municipal, na noite de quarta-feira, 11 de julho, com o tema “Legislação sobre as Drogas e Soluções”.
De acordo com ele, a descriminalização teria que ser feita “com razoabilidade”. O magistrado, no entanto, é contrário a punição aos usuários. “O usuário é um doente que não tem que ser punido; ele tem que receber tratamento controlado porque o problema dele é de saúde pública”, sentencia.
Para Malheiros, a maior urgência é combater os grandes traficantes de drogas. Para isso, propõe a presença ostensiva das Forças Armadas nas fronteiras “para cortar a fonte de entrada da matéria prima”. Segundo ele, “não adianta prendermos apenas os ‘Zezinhos’ enquanto o grande traficante fuma charuto Havana em apartamentos de luxo”.

Poder paralelo

O combate ao tráfico, na opinião do desembargador, tem que ser feito com inteligência e mobilizar toda a sociedade. “Não há fórmula pronta. Tem que haver união entre todos nós, mas depende, basicamente, de vontade política”, prega. Malheiros critica a omissão do Estado “que abandonou a sociedade” e permitiu ao crime organizado, sobretudo, o tráfico, transformar-se em “poder paralelo”.
Como membro da magistratura e presidente da Comissão de Justiça e Paz de São Paulo, ele conhece a realidade das ruas e fez uma série de relatos de situações dramáticas de usuários de crack de todas as idades e classes sociais, inclusive crianças de 5 anos e até um professor de Direito que encontrou na antiga ‘Cracolândia’, em São Paulo.
Malheiros fez um relato da situação de uma favela na Zona Norte da Capital, dominada por um traficante chamado Alemão, que montou escola, ambulatório médico, emprega jovens, garante a segurança e oferece até transporte gratuito aos moradores. “O traficante é um sedutor que destrói vidas, mas que é admirado e respeitado”, resigna-se ao reiterar críticas à ausência e omissão do Estado.

Leis

Antonio Carlos Malheiros é contra a diminuição da maioridade penal. De acordo com ele, falta informação e conscientização à sociedade em geral. “Sofremos de ‘legislorreia aguda’. Diante de uma tragédia, a população inconsciente quer mudanças nas leis. Mas não é preciso, basta aplicar corretamente as que já temos”.
O desembargador entende que o Judiciário precisa estar mais próximo da população e defende que juízes, promotores, estudantes de Direito e autoridades em geral saiam às ruas, visitem favelas e tenham mais contato com as pessoas para conhecer melhor a realidade que as cerca.
“O juiz não é um semideus como muitos se consideram; o bom juiz é o que sente o gosto das lágrimas das pessoas. Falo aos meus alunos que eles têm que ler os livros didáticos, mas que o livro da vida está no bueiro, no esgoto, no chão sujo das prisões, no chão enlameado das favelas”, enfatiza.
A palestra foi fruto de parceria entre a Câmara Municipal, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), subseção de Araraquara, e Conselho Municipal de Segurança (Conseg). A iniciativa partiu do vereador Elias Chediek Neto (PMDB).